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Em 2021, Rio Branco poderá repetir epidemia de dengue igual a vivida em 2009

Nova administração do prefeito Tião Bocalom terá de priorizar campanhas de divulgação e outras medidas mais incisivas para que a capital acreana não passe por uma explosão de casos igual a registrada onze anos atrás

REPÓRTER OPINIÃO

Se a nova gestão do prefeito de Rio Branco, Tião Bocalom (Progressistas), não tomar medidas enérgicas de combate à dengue, a doença poderá tornar-se em muito breve numa epidemia de proporções só registradas em 2009, quando então no final do primeiro semestre deste mesmo ano, o Acre contabilizava ao menos 15.999 casos, com 111 complicações graves, 13 casos do tipo dengue hemorrágica e 3 mortes.

O alerta é de profissionais de Saúde ouvidos nesta quinta-feira, 7, pelo OPINIÃO, que estão na frente do combate à dengue e à covid-19 ao mesmo tempo, nas unidades de saúde do município. Muitos vivenciaram diretamente aquele período, no auxílio às vítimas, pouco mais de onze anos atrás.

Embora pese o fato de que Bocalom foi empossado no cargo de prefeito há apenas oito dias, a importância de uma comunicação eficiente se faz necessária com máxima urgência, seja por meio de outdoors, seja por panfletos e folderes para conscientizar a população de que ela deve colaborar com o Poder Público, como agente principal de redução no número de contaminações.

A importância do envolvimento coletivo para que seja interrompida a tendência de aumento de casos é fundamental neste início de janeiro, entendem os trabalhadores em Saúde consultados. “Pelo que estamos observando neste momento, tudo indica que caminhamos para uma epidemia igual a ocorrida em 2009”, alertam os trabalhadores das Unidades de Referência da Atenção Primária (Uraps) ouvidos sob a condição de anonimato.

Naquele ano, o maior pico de casos aconteceu em fevereiro e março, quando foram enfatizadas ações conjuntas entre o governo do Estado do Acre e as prefeituras para reverter o quadro emergencial.

“É preciso que as administrações públicas não esqueçam que além da dengue, o mosquito aedes aegypti também transmite o vírus da zika e da chikungunya. Por isso, as pastas da Saúde devem redobrar as orientações e as visitas técnicas para intensificar as ações de prevenção e controle das doenças”, havia alertado um médico especialista ouvido em outra reportagem do OPINIÃO, publicada nesta terça-feira, 5.

Cenário ainda é mais desafiador por causa da covid-19

No corredor da Unidade de Referência da Atenção Primária (Urap) Augusto Hidalgo de Lima, no bairro Palheiral, em Rio Branco, a agente de saúde Ivanilde Oliveira orienta com todo o carinho os pacientes que serão atendidos, logo mais na sala de coleta para os exames. A sua preocupação neste período de inverno é a para que as pessoas, além da covid-19, mantenham o alerta dobrado contra a dengue, doença que acomete pelo menos 10% dos pacientes que procuram diariamente a unidade.

Na mini-palestra, improvisada ali mesmo, em meio aos pacientes, Ivanilde dispara: “Olha, gente, dengue é coisa séria. Depois que apareceu o coronavírus, tudo é covid-19. A impressão é a de que as outras doenças desapareceram. Mas isso não é verdade. Os sintomas da dengue são bem parecidos com os da infecção da covid. E às vezes, a dengue está bem perto da nossa casa, porque cuidamos da nossa, mas o vizinho não cuida da dele. Ele simplesmente não faz a sua parte”. A profissional de Saúde fala com propriedade, já que teve um filho que pegou ao mesmo tempo as duas doenças.

Mas se sobra força de vontade para Ivanilde Oliveira compartilhar as informações de prevenção com os pacientes da Urap em que ela trabalha, faltam ações enérgicas lá em cima, na ponta da nova administração pública municipal.

Na manhã da última quarta-feira, 6, o secretário Municipal de Saúde, Frank Silva Lima, afirmou a emissoras de TV que a pasta aguarda informações do sistema de Levantamento Rápido de Índices para Aedes aegypti, na sigla LIRAa, para ter um diagnóstico de como está a disseminação da dengue no município de Rio Branco. Os números, no entanto, só deverão estar formatados somente na segunda-feira, 11, ou seja daqui a três dias.

“Com esse levantamento é que poderemos iniciar uma ação conjunta com a Zeladoria [Secretaria Municipal de Zeladoria da Cidade, a SMZC] e com outras secretarias para que possamos traçar as ações que vamos colocar em prática”, ressaltou Frank Lima.

O LIRAa permite descobrir a situação da dengue no município em uma semana, e identifica quais os bairros mais críticos e quais depósitos de focos são predominantes em cada área.

O secretário Municipal de Saúde classifica a pandemia de covid-19 como um fato desafiador diante da situação endêmica da dengue, e pediu para que a população colabore. “Pedimos o apoio da Sesacre [Secretaria de Estado de Saúde do Acre], e também queremos que os moradores de Rio Branco colaborem, porque a prefeitura, sozinha, não pode sem a ajuda de todos”, apelou o gestor. Frank Lima afirmou ainda que a secretaria vai reforçar orientações e procedimentos voltados para a dengue nas doze Uraps de Rio Branco.

Mesmo com todas essas dificuldades, a reportagem verificou uma única equipe da SMZC trabalhando na rua do Divisor, entre os bairros Eldorado e Vitória, na parte alta da cidade, na região do São Francisco. Ali, homens da secretaria, com o auxílio de uma máquina retroescavaderia e uma caçamba, faziam a retirada de entulhos jogados pelos moradores em frente de suas casas a pedido da própria prefeitura.

Campanha de conscientização para a limpeza de quintais deve ser prioridade

Ao circular pela cidade, OPINIÃO verificou que inúmeros quintais e terrenos baldios encontram-se em completo abandono. Na rua Rio Grande do Sul, duas grandes áreas, incluindo uma ao lado de uma igreja evangélica de grande porte, o matagal tomou de conta, acumulando suspeitas de muita sujeira e poças d’água.

Na rua Marechal Deodoro, já praticamente no centro da capital acreana, um terreno acumula sujeira e mato próximo de uma base da Polícia Militar da rua Minas Gerais.

Em anos anteriores, somente com uma campanha maciça de conscientização por meio de outdoor e de outros recursos fundamentais de comunicação, a Prefeitura de Rio Branco obteve êxito, já que permitiu mudança de hábitos nas pessoas e a consequente redução de casos.

Na rua Boa Vista, no bairro Vitória, pneus de carro espalhados também são um problema, ameaçando o acúmulo de água e a consequente proliferação do mosquito, já que o aedes aegypti, transmissor da doença e também da chikungunya e da zika, necessita de água parada para expelir seus ovos, que se tornarão larvas e vão virar novos mosquitos para contaminar mais pessoas.

A reportagem constatou também que na esquina da rua Campo Grande com a Tião Natureza, a menos de 50 metros da Urap Augusto Hidalgo de Lima, um conjunto de pneus velhos de automóveis acumulava água da chuva, causando risco de contaminação para os moradores próximos.

De 50 atendimentos, dez são de pacientes suspeitos de dengue, todos os dias

A Urap Augusto Hidalgo de Lima está localizada na região de maior densidade populacional de Rio Branco, na entrada da Baixada da Sobral, onde hoje moram pelo menos 80 mil pessoas, em mais de dez bairros.

Dentro desse vasto número de comunidades que compõem a baixada, são inúmeras as Uraps. Mas algumas possuem deficiência para atender e direcionam os seus pacientes, muitas vezes, para a Unidade de Pronto Atendimento Franco Silva, a UPA da Sobral, esta última administrada pela Sesacre.

Esse, no entanto, não é o caso da Hidalgo de Lima, considerada uma das maiores Uraps da região. Segundo explica a coordenadora interina, Carlessandra Marques, das 27 fichas distribuídas, em média, por dia, para atendimento médico, sete ou oito são de pessoas com suspeitas de contaminação por dengue.

“Hoje [quinta-feira, 6] estamos com dois médicos e 50 fichas de atendimento com 25 para cada um. Nesta condição, uns dez pacientes estão com suspeitas de dengue”, explica a gestora.

A média de 10% de casos de dengue de todos os atendimentos é considerada altíssima se levado em consideração que em outras estações do ano, esse número cai para um ou dois pacientes acometidos pela doença, de acordo com Carlessandra Marques. A unidade recebe também pacientes com sintomas leves de covid-19 e dá suporte a grávidas ou mulheres que já estão no período do resguardo.

Homem relata agonia de ter os sintomas da doença

Morador do bairro Bahia Velha, Antônio Carlos de Araújo, 59 anos, aguardava para ser atendido na Urap depois de vir da UPA da Sobral. “Corri para lá, me disseram que meu caso pode ser dengue, e depois de uma injeção que me aplicaram me encaminharam aqui para o posto do município”, disse.

Araújo está com sete dias sentindo calafrios, dores pelo corpo e febre alta. Tremia o queixo enquanto concedia entrevista. “Estou até agora sem saber como peguei isso. Se é dengue mesmo ou outra coisa. Mas lá por perto da minha casa, as pessoas não têm consciência de que limpeza é importante”, lamenta o paciente.

Febre alta, dor na cabeça e atrás dos olhos, manchas e até erupções na pele, além de náuseas, vômito e tonturas são alguns dos sintomas conhecidos por quem já foi acometido pela dengue.

Acre viveu sete epidemias nos últimos 20 anos

Com os primeiros casos de dengue registrados em 1995, o Acre já passou por pelo menos sete epidemias nos últimos 20 anos. Dados da Vigilância Epidemiológica, da Sesacre, mostram que a partir do ano 2000, com os primeiros casos de origem local, a doença só aumentou, se manifestando de forma endêmica e com o registro de sete epidemias em 2000, 2004, 2005, 2009, 2010, 2011 e 2014.

No Acre, os casos notificados, historicamente, começam a aumentar nos meses de outubro a novembro e seguem pelos primeiros meses do primeiro semestre, por causa da alta densidade de chuvas.

Por isso, a atenção da população deve ser redobrada. A falta de cuidados com quintais e depósitos que possam acumular água pode significar um aumento de criadouros para o mosquito transmissor, que também é vetor da febre chikungunya e zika vírus.

Matéria publicada no Jornal Opinião, o único jornal impresso em circulação no Acre

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